O Desafio das Reformas nas Pensões: Portugal e Singapura em Perspetiva
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- 28 de out. de 2024
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Um Sistema à Beira do Colapso?
O sistema de pensões em Portugal enfrenta uma crise iminente. À medida que a população envelhece e a base de contribuintes se reduz, o modelo atual, baseado no princípio de repartição (“pay-as-you-go”), parece estar a caminhar para uma insustentabilidade inevitável. Esta realidade coloca-nos perante uma questão crucial: será que o país está disposto a fazer as reformas necessárias para evitar um colapso financeiro nas próximas décadas?
Para perceber melhor o que está em jogo, vale a pena olhar para Singapura, um exemplo de como a prudência económica e a responsabilidade individual podem construir um sistema sustentável e resiliente. Podemos também aprender com a Suíça e a Irlanda, países que conseguiram equilibrar o crescimento económico com a proteção social através de sistemas inovadores e sustentáveis. Ao comparar os quatro modelos, ficamos com uma imagem clara de caminhos distintos e das suas respetivas consequências.
1. Portugal: O Peso do Estado e a Dificuldade em Reformar
O sistema de pensões português é sustentado por um princípio aparentemente simples: as contribuições dos trabalhadores ativos financiam as pensões dos reformados. Atualmente, os trabalhadores contribuem com 11% do seu salário, enquanto os empregadores são obrigados a cobrir 23,75%, um dos valores mais elevados na Europa. Mas será este modelo viável a longo prazo?
A realidade demográfica é implacável. Portugal está a envelhecer rapidamente, e a taxa de natalidade é das mais baixas da Europa, com apenas 1,4 crianças por mulher (o necessário para substituir a população seria 2,1). Em 1970, havia seis trabalhadores para cada reformado. Hoje, esse número caiu para apenas dois, e projeta-se que desça para 1,3 em 2050. Este desequilíbrio está a colocar uma pressão tremenda no sistema. Os jovens, ao sentirem o peso desta responsabilidade, enfrentam um futuro de contribuições mais altas e benefícios cada vez mais reduzidos.
Outro problema grave é o peso da dívida pública. Atualmente, a dívida nacional ronda os 113% do PIB, em grande parte impulsionada pelos custos com as pensões. Em 2022, as pensões representavam mais de 13% do PIB, e a previsão é que este valor suba para 16% em 2050 se nada for feito. Com um crescimento económico médio abaixo de 2% na última década, é difícil ver como o país poderá sustentar este fardo. Continuar a aumentar impostos não é solução, uma vez que já prejudica a competitividade das empresas e desencoraja a criação de emprego.
2. Singapura: Responsabilidade Individual e Prudência Económica
Do outro lado do mundo, Singapura apresenta-nos um modelo muito diferente. O sistema de pensões é baseado na responsabilidade individual através do Fundo Central de Providência (CPF), um esquema de poupança obrigatória que abrange não só a reforma, mas também a saúde e a habitação. Aqui, tanto empregados como empregadores contribuem para contas individuais, com taxas que chegam a 37% para trabalhadores abaixo dos 55 anos (20% dos empregados e 17% dos empregadores).
Este sistema é estruturalmente sustentável, pois cada pessoa é responsável por poupar para o seu futuro, reduzindo a dependência do Estado. Assim, Singapura consegue manter impostos baixos e atrair investimento estrangeiro, incentivando o crescimento económico. Com um crescimento médio do PIB de cerca de 5% ao ano na última década, Singapura é um exemplo de como a prudência fiscal e a responsabilidade individual podem criar um ciclo virtuoso de prosperidade. Além disso, o sistema de poupança obrigatória permite que o governo acumule capital que é reinvestido em infraestruturas e inovação, beneficiando toda a economia.
Claro, este modelo também tem as suas desvantagens. Depender tanto da responsabilidade individual pode criar disparidades. Quem não poupar o suficiente pode enfrentar dificuldades na reforma. Mas, ao contrário de Portugal, Singapura promove uma cultura de auto-suficiência, encorajando os cidadãos a planear para o futuro. Em vez de esperar que o Estado resolva todos os problemas, cada singapurense sabe que o seu bem-estar financeiro depende, em grande parte, das suas próprias escolhas.
3. Exemplos da Suíça e da Irlanda: Modelos de Sucesso na Europa
Suíça:
A Suíça tem um sistema de pensões que combina segurança social com contas individuais, misturando elementos dos modelos de Portugal e Singapura. O sistema é composto por três pilares:
Pilar Público (AHV): Todos os trabalhadores contribuem para uma pensão básica, financiada por contribuições de empregados e empregadores, semelhante ao sistema português. A contribuição total é de 10,6% (dividida entre empregador e empregado), bastante inferior às taxas de Portugal.
Pilar Privado Obrigatório: Empresas e trabalhadores são obrigados a contribuir para planos de pensões profissionais, promovendo a poupança individual.
Pilar Voluntário: Incentivos fiscais para quem desejar poupar mais para a reforma.
Este modelo tripartido garante que os cidadãos suíços não dependam exclusivamente do Estado e incentiva a poupança pessoal. A Suíça mantém um baixo nível de dívida pública (cerca de 40% do PIB) e cresce a uma média de 2% ao ano, com uma economia dinâmica e diversificada. Ao equilibrar a responsabilidade estatal com a individual, a Suíça conseguiu manter um sistema robusto e sustentável.
Irlanda:
A Irlanda reformou o seu sistema de pensões para evitar as armadilhas de uma população envelhecida e as consequências de um modelo insustentável. Nos anos 2000, introduziu o Pension Reserve Fund, uma espécie de fundo soberano para garantir a sustentabilidade a longo prazo do sistema de pensões públicas. Este fundo permitiu à Irlanda reduzir a pressão imediata sobre o orçamento do Estado, financiando parte das pensões através de retornos de investimento.
Além disso, a Irlanda incentiva fortemente os planos de pensões privados, com benefícios fiscais para empresas e trabalhadores que poupam para a reforma. Isto não só promove a responsabilidade individual, como também permite que o governo mantenha impostos relativamente baixos, criando um ambiente atrativo para investimento estrangeiro. Não é coincidência que a Irlanda registe um dos maiores crescimentos económicos da Europa (cerca de 4% ao ano) e seja um polo para grandes empresas tecnológicas.
4. O Que Portugal Pode Aprender com Singapura, Suíça e Irlanda?
A questão é simples: queremos continuar a confiar num sistema que caminha para a falência ou estamos dispostos a considerar reformas reais, mesmo que difíceis? Portugal precisa de aprender algumas lições destes países. A promoção da poupança privada e o incentivo à auto-suficiência são passos essenciais. Para evitar a insolvência, é necessário rever as regras da reforma antecipada e alinhar a idade da reforma com a esperança de vida.
Os modelos da Suíça e da Irlanda mostram que não se trata de escolher entre o bem-estar social e o crescimento económico. Pelo contrário, um sistema de pensões sustentável pode apoiar o crescimento, desde que incentive a responsabilidade individual e minimize a dependência do Estado.
5. Impacto no Crescimento Económico: Portugal e a Necessidade de Reformas
Em Portugal, os elevados custos com pensões estão a limitar a capacidade do Estado para investir em áreas essenciais que impulsionam o crescimento económico. As empresas enfrentam um dos maiores encargos fiscais sobre o trabalho na Europa, o que desencoraja a criação de emprego e sufoca o dinamismo empresarial. Esta situação é agravada pela falta de reformas estruturais, que continuam a ser adiadas por medo das repercussões políticas. Se nada mudar, o país verá a sua dívida pública continuar a subir e o crescimento económico a estagnar.
Conclusão: Uma Escolha de Futuro
O dilema de Portugal é claro. Podemos continuar a prolongar uma situação insustentável, atirando dinheiro para um problema que só vai crescer, ou podemos enfrentar a realidade e adotar um modelo que equilibre a proteção social com a responsabilidade económica. Se queremos evitar que os jovens trabalhadores de hoje sejam os próximos a pagar por um sistema falido, é hora de mudar.
Singapura, Suíça e Irlanda mostram-nos que é possível ter um sistema de pensões sólido sem sacrificar o crescimento económico. Portugal precisa de um modelo que promova a poupança individual, reduza a carga sobre os empregadores e, sobretudo, assegure que a próxima geração tenha a liberdade de prosperar, sem carregar o peso das dívidas e promessas não cumpridas do passado. A escolha é nossa – e o tempo para agir é agora.
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