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Subsídios de Desemprego: Uma Rede de Segurança ou um Convite à Dependência?

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  • 28 de out. de 2024
  • 5 min de leitura

Nos dias que correm, os subsídios de desemprego são um pilar do Estado Social. Para muitos, representam uma tábua de salvação, um apoio financeiro que permite atravessar a tempestade do desemprego com alguma dignidade. Mas, como em tudo o que envolve dinheiros públicos, há sempre dois lados: o lado da solidariedade e o lado da tentação, o lado do apoio e o lado do abuso. E talvez seja hora de discutir se os subsídios de desemprego em Portugal estão a cumprir a sua missão ou a transformar-se numa almofada demasiado confortável para quem prefere não procurar um novo rumo.



Os Benefícios: Uma Necessidade Indiscutível

Comecemos pelo óbvio: em tempos de crise económica, como a que vivemos recentemente com a pandemia, os subsídios de desemprego são um salva-vidas. Quando o emprego desaparece de um dia para o outro e o pânico se instala, este apoio garante que as famílias continuam a pagar as suas contas e a pôr comida na mesa. Portugal, tal como muitos outros países, expandiu os apoios durante a pandemia, simplificando o acesso ao subsídio de desemprego e criando medidas temporárias para apoiar quem ficou de repente sem rendimentos.


Em 2020, o número de beneficiários de subsídios de desemprego em Portugal subiu para 221 mil pessoas, um aumento de 29% face ao ano anterior, segundo dados do Instituto do Emprego e Formação Profissional (IEFP). Este aumento reflete a resposta necessária para mitigar os efeitos da crise, mas também coloca questões sobre a sustentabilidade.


Comparando com os Estados Unidos, onde o governo expandiu generosamente os apoios com programas como o Pandemic Unemployment Assistance (PUA), Portugal adoptou uma abordagem menos arriscada. Nos EUA, durante o pico da pandemia, o número de pessoas a receber subsídios de desemprego ultrapassou os 30 milhões, e o governo gastou cerca de 260 mil milhões de dólares em apoios extraordinários. Em Portugal, os apoios temporários para trabalhadores independentes e medidas extraordinárias para quem esgotou o subsídio de desemprego foram eficazes para manter alguma estabilidade, mas aumentaram a dívida pública para 133,6% do PIB em 2020, colocando uma pressão significativa na economia.


Na Suíça, a abordagem é mais equilibrada e sistemática. O sistema de seguro-desemprego é generoso, oferecendo até 80% do último salário por um período limitado, mas com uma cláusula rigorosa: quem recebe apoio tem de provar que está activamente à procura de emprego. Em Portugal, apesar de também existir um requisito formal de procura ativa, sabe-se que na prática este controlo é menos eficaz. Estudos do Instituto Nacional de Estatística (INE) indicam que uma parte significativa dos beneficiários participa em cursos de curta duração ou candidaturas simbólicas apenas para cumprir os requisitos mínimos.



Os Problemas: Entre a Tentação e a Realidade

Mas nem tudo são rosas. Há um lado menos bonito nos subsídios de desemprego, e é precisamente este que os críticos não se cansam de apontar. Subsídios demasiado generosos podem, sem querer, criar uma espécie de desincentivo ao trabalho. Durante a pandemia, muitos americanos perceberam que, em alguns casos, era mais vantajoso ficar em casa a receber apoios do que voltar aos seus antigos empregos. Um estudo do National Bureau of Economic Research (NBER) mostrou que os benefícios de emergência nos EUA resultaram numa taxa de substituição do rendimento superior a 100% para dois terços dos beneficiários — ou seja, recebiam mais do que ganhavam a trabalhar.


Portugal não ficou imune a esta realidade. As medidas extraordinárias criadas para ajudar durante a pandemia, como o layoff simplificado, permitiram que muitas empresas se mantivessem à tona. No entanto, também levantaram questões sobre a dependência a longo prazo. De acordo com o IEFP, 33% das empresas que recorreram ao layoff admitiram ter prolongado as medidas mais do que o necessário, uma vez que o apoio estatal reduzia os custos de operação. Resultado? Um mercado de trabalho que ainda não recuperou totalmente, com uma taxa de desemprego a rondar os 6,8% em 2021, relativamente alta para os padrões pré-pandemia.


Este é um perigo real que a Suíça conseguiu evitar graças a uma gestão rigorosa dos subsídios. Durante a pandemia, o país registou uma taxa de desemprego de apenas 3,3%, uma das mais baixas da Europa, precisamente porque os incentivos para regressar ao trabalho foram mantidos altos. Ao contrário do que acontece em Portugal, onde as regras de verificação são mais brandas, na Suíça os beneficiários têm de provar regularmente que estão a participar em entrevistas ou formações relevantes, sob pena de perderem o direito ao subsídio.


E depois, claro, há o velho problema da fraude. Onde há dinheiro fácil, há sempre quem tente aproveitar-se. Durante a pandemia, países como os EUA e o Reino Unido perderam milhões de dólares para fraudes nos sistemas de desemprego. Portugal também não escapou ileso. Em 2020, a Autoridade para as Condições do Trabalho (ACT) e a Segurança Social reportaram um aumento de 15% nos casos de fraude relacionados com o layoff e subsídios de desemprego, mostrando que, quando o sistema se torna mais flexível, há sempre quem tente espremer o máximo.



O Equilíbrio Precisa-se: O Que Fazer?

Se há algo que podemos aprender com tudo isto, é que os subsídios de desemprego precisam de um equilíbrio delicado. São essenciais, mas têm de ser bem geridos. Devem ser um trampolim para ajudar as pessoas a recuperar, e não uma rede de descanso permanente. Os subsídios devem incentivar a procura de trabalho, não desincentivá-la. E devem ser temporários, claros e estritamente monitorizados.


A solução pode passar por subsídios escalonados, que diminuem ao longo do tempo. Em Portugal, os subsídios são calculados com base no salário anterior, mas mantêm-se constantes durante um período alargado. Talvez uma abordagem mais dinâmica, onde o apoio vai diminuindo gradualmente, incentive um regresso mais rápido ao trabalho. Em Singapura, esta lógica é aplicada de forma indirecta através do investimento em programas de requalificação, como o SkillsFuture. Durante 2020, mais de 540 mil singapurianos participaram em cursos financiados pelo governo para melhorar as suas competências, reduzindo a dependência do Estado e reforçando a capacidade de se adaptarem a novos desafios no mercado.


Outra área que precisa de atenção em Portugal é a fiscalização. Se a Suíça é conhecida pela sua eficiência e rigor, Portugal ainda tem um caminho a percorrer. Os mecanismos de controlo de procura de emprego são frequentemente vistos como uma formalidade. Implementar um sistema de verificação mais robusto e digitalizar processos de candidatura poderiam ser passos importantes para reduzir fraudes e garantir que apenas quem realmente necessita recebe o apoio.



Comparação e Conclusão: Aprender com os Melhores Exemplos

Se queremos subsídios de desemprego que funcionem e sejam sustentáveis, temos de olhar para os melhores exemplos e tirar algumas lições. Nos Estados Unidos, vimos os perigos do excesso, com apoios tão generosos que atrasaram a recuperação económica. Em Portugal, a abordagem foi mais cautelosa, mas ainda assim levantou questões sobre dependência e sustentabilidade a longo prazo. Em 2021, Portugal gastou cerca de 1,5 mil milhões de euros em subsídios de desemprego e medidas associadas, um aumento de 20% face a 2019, que pesa no orçamento e levanta preocupações para futuras crises.


A Suíça dá-nos um exemplo de como gerir apoios com equilíbrio: generosos, sim, mas com exigência de responsabilidade. E Singapura mostra-nos que o futuro pode passar por investir na requalificação, criando um modelo onde o apoio financeiro é substituído pela capacitação e inovação.


No final, é tudo uma questão de bom senso. Subsídios que ajudam, sim, mas que não criem uma cultura de dependência. Fiscalização rigorosa para evitar fraudes e abusos. E, acima de tudo, uma política clara que promova a autossuficiência e a dignidade. Porque prometer mundos e fundos é fácil; difícil é pagar a factura no fim do mês. Portugal deve olhar para estes exemplos, aprender com os erros dos outros e preparar-se para a próxima crise com uma estratégia que seja sustentável, justa e, acima de tudo, realista.

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